O Ministério Público Federal vai
recorrer ao Supremo Tribunal Federal pelo direito dos povos indígenas de
serem consultados em empreendimentos que afetem diretamente sua
sobrevivência, como é o caso da usina de Belo Monte, autorizada pelo
Congresso Nacional sem ouvir os índios. Em julgamento hoje no Tribunal
Regional Federal da 1ª Região, em Brasília, a desembargadora Maria do
Carmo Cardoso desempatou a questão a favor do governo: “pouco importa se
a consulta é feita antes ou após a autorização”, disse.
A desembargadora foi a última de
três juízes a se manifestarem sobre o processo que defende consulta
prévia para aprovação de Belo Monte, iniciado em 2006 pelo MPF no Pará.
Em seu voto, afirmou que as consultas são um “privilégio” dos povos
indígenas, porque em outras obras do mesmo tipo as comunidades afetadas
“não seriam ouvidas”. A interpretação de Cardoso tomou 15 minutos da
sessão de hoje, 9 de novembro, da 5ª Turma do TRF1 e acompanha o voto do
desembargador Fagundes de Deus, que também havia votado a favor do
governo federal na sessão da semana passada.
Ambos têm entendimento oposto ao
da relatora Selene Almeida, que na primeira sessão do julgamento, ainda
em outubro, num voto de mais de 2 horas, sustentou que a Constituição
brasileira e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho
prevêem como direito fundamental dos povos indígenas as consultas
prévias, livres e informadas em projetos e obras que lhes afetem
diretamente.
“Apenas quando a consulta prévia
concede as comunidades interessadas a real oportunidade de manifestar
sua vontade e influir na tomada de decisão, é válida. O diálogo deve
servir para que as populações tradicionais participem das decisões que
de fato tenham a ver com o seu desenvolvimento”, disse Selene Almeida.
“Sugerir que a consulta pode ser
feita após a autorização é tão desrespeitoso que chega a ser absurdo.
Temos convicção de que esse não é o sentido do artigo 231 e da Convenção
169. A consulta não tem nada de privilégio, é uma questão de
sobrevivência dos povos indígenas assegurada pela Constituição Federal,
da qual não pode se afastar o Judiciário””, diz o procurador-chefe do
MPF no Pará, Ubiratan Cazetta.
“Nos causou surpresa porque o
resultado desse julgamento é contrário ao que o próprio TRF1 tinha
decidido, no mesmo processo (em exame liminar) no ano de 2006. Agora só
resta o Supremo Tribunal Federal para nos dizer se a Constituição é
válida ou não no Brasil”, acrescentou o procurador da República Felício
Pontes Jr, um dos autores da ação que pedia a observância do direito de
consulta.
Todos os estudos sobre Belo
Monte, inclusive os oficiais, apontam para a mesma conclusão: haverá
mudança drástica na cadeia alimentar e econômica das populações
indígenas afetadas pela usina. A mudança de vida vai ser provocada por
vários fatores, como aumento da pressão fundiária e desmatamento no
entorno, meios de navegação e recursos hídricos comprometidos ou
suprimidos, atividades econômicas - pesca, caça e coleta afetadas,
estímulo à migração indígena (da terra indígena para núcleos urbanos),
aumento da vulnerabilidade da organização social, aumento das doenças
infectocontagiosas e zoonoses.
Depois que o acórdão for
publicado pelo TRF1, o MPF tem 15 dias para recorrer ao Supremo por meio
de um Recurso Extraordinário. Outras dez ações contra a construção de
Belo Monte ainda tramitam na Justiça.
Fonte: MPF/PA
Texto extraído do sítio Articulação dos Povos Indígenas do Brasil
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